Copiar O verbo é engraçado, embora tenha uma conotação extremamente negativa, ou melhor, durante anos teve uma conotação negativa, porque hoje em dia está na berra. Copiar é que está a dar. Em primeiro lugar todos copiamos, ninguém inventa coisa nenhuma. Todos nos baseamos em alguém ou em alguma coisa. Pronto, está bem, copiar, deste ponto de vista, é natural e salutar. Mas por favor não queiram banalizar a questão. Só há dois tipos de pessoas que copiam: os maus estudantes e as pessoas estúpidas. Um mau estudante não estuda, copia pelo bom estudante e, como esperto que é, até saca uma nota melhor graças ao parlapié, vulgo encher chouricinhos. Uma pessoa estúpida não tem ideias suas, nem miolo, e como tal, como só tem côdea, vive com a sua côdea e o miolo dos outros. Muitas destas pessoas até se apropriam do miolo das outras e assinam por baixo. Temos o plágio, a apropriação indevida, a noção de autoria esventrada. Na infância é mais ou menos natural copiar, faz parte da aprendizagem. Um boneco mais bonito, uma letra mais bonita, uma caneta de cor e de cheiro, invejamos tanto o que o vizinho do lado tem que temos de comprar o mesmo, na mesma loja, ter um igual, ou então desenhar os mesmos bonecos, com as mesmas cores, os mesmos lápis e canetas. Faz parte do processo de aprendizagem, porque aprendemos as letras e os números copiando-os um a um inúmeras vezes (pelo menos no meu tempo era assim). Até o exercício físico se aprende copiando. E quando são os adultos a copiarem-se desgraçadamente uns aos outros? Há coisas cuja noção de autoria é mais do que evidente, como uma obra literária, uma peça musical, um quadro…mas, e se me copiarem uma viagem, uma roupa, um penteado? Poderei processar a pessoa? E se me copiarem os passos que eu dou na vida? E se alguém se casar porque eu casei? E se alguém for viver para uma casa e a decorar como eu? Poderei processar essa pessoa? Na verdade, dir-me-ão, posso simplesmente ignorar, mas é ou não é irritante que, cada vez que abramos a boca para dizer uma coisa, alguém nos copie os actos? Nem imaginam o que se sente, o grau de irritação, o desmancha-prazeres que é termos alguém à coca, que à socapa quer ser como nós, em teoria, mas que na prática é uma antítese, nem sequer chega a cópia mal feita… Porra, que é demais. Apetece fazer como a minha amiga Patrícia me disse para fazer: mentir ou então fazer papel de palhaça a ver se sou imitada. É que realmente apetece, mas eu nem sou capaz. Sou tosca demais. Com a vida, temos de nos lembrar, vezes sem conta, que no cinismo é que está o ganho. Ser cínico, sonsinho, palonço, pacóvio, pateta, ou fazermo-nos de tal parece dar lucro, até monetário. O mundo é dos idiotas, se não fores um torna-te rapidamente. Para não sermos copiados, o melhor é fazermos coisas arriscadas que sabemos que a outra pessoa não faz. Na volta, até faz e contribuímos para a evolução de um idiota! Um idiota que não saltava à corda passa a saltar só para nos copiar. Quando eu era miúda, armava-me em parva e copiava o meu irmão: era assim que eu fazia asneiras e quase partia a cabeça, mas também era assim que eu aprendia os meus limites. Copiar tem essa vantagem: percebermos até onde podemos ir. Temos de ter uma certa flexibilidade e uma certa força para enfrentar a cópia desmesurada, a cópia injusta, a cópia da inveja, porque elas acontecem diariamente, e por vezes orquestradas de um modo subtil, que ofende a dignidade de qualquer um. Ninguém está imune ou protegido contra isso, e normalmente os «copiões» são perigosos, porque se apropriam de ideias nossas de tal maneira que também se podem apropriar da nossa vida, dos nossos sentimentos, das pessoas com quem estamos…mas em vez de temê-los, devemos proteger-nos, não permitir nunca que alguém ávido de copiar saiba quem somos, como somos, que vida temos (portanto, há que parar de ser desbocado), que fotografias tirámos, onde fomos de férias, etc. Em segundo lugar, devemos fingir, entrar no jogo deles, parecer tolinhos, repetir muitas vezes «ai é?? Fizeste isso?» mesmo que saibamos tudo, parecer tolinho dá sempre a ideia a um idiota que copia que somos estúpidos, e enquanto isso estamos simplesmente a sair da linha de vista. Ficar indiferente é difícil, mas devemos tentar. Alguém que copia está simplesmente a dizer «Cu-cu! Quero ser como tu! Ó pra mim a fazer as mesmas coisas!!!!», por isso, se não dermos atenção a este tipo de atitude, vamos vencer um «copião» pelo cansaço. Um dia ele ou ela perceberão que já ninguém liga a tanta merda que vai naquelas cabeças tontas…Deixe que todos entendam que ele ou ela estão a copiar, e verá que um copião passa a ser o espião mais odiado de todos os tempos, no emprego, na família, na vida social, no circuito das amizades. Haja esperança que os copiões se reformem da bisbilhotice e se façam à estrada. Dias melhores virão. |
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