Thursday, September 20, 2007

«Declaro-vos marido…e marido»

Confesso que nunca iria ver o filme, achei desde logo que seria dinheiro mal gasto, uma comédia tosca e bacoca. Mas não. Havia duas opiniões, para mim de confiança, a do Paulo e a da Patrícia, que diziam bem do filme. Por isso fui vê-lo, sozinha, numa tarde em que não me apeteceu voltar para casa cedo.
O mérito do filme não é a história, que não me parece extraordinária, mas a mensagem, directa, simples e pedagógica: todos diferentes todos iguais. Um pai, bombeiro de profissão, viúvo há três anos, resolve casar com um colega e amigo de longa data, forjando a sua orientação sexual, de forma a deixar os filhos seguros em caso de acidente ou morte. O amigo, mulherengo convicto, entra na jogada para safá-lo.
O casamento, uma fraude mal encenada, é investigado a pente fino, pelo que os dois homens ficam num dilema: como se comportam os gays? Este é talvez o mito ou o estereótipo que mais domina a história, porque o homem que os investiga chega a dizer-lhes «o vosso lixo não me parece gay». Colocados perante este problema, os dois homens, heterossexuais, tentam entender o que fazem dois gays numa casa onde habitam também duas crianças (curiosamente, o rapaz tem tendências homossexuais), dizendo coisas como «estamos sempre a fazer sexo…sexo muito gay», dando palmadas no rabo um do outro constantemente e mandando piropos ao rabo do carteiro. A personagem de Adam Sandler (desculpem nunca me lembrar do nome das personagens nos filmes) diz «vou buscar os meus discos do Boy George» (fartei-me de rir com essa referência) e arranja um quadro dos Wham nos seus primórdios.
Um dos momentos altos do filme é a festa gay, onde luz, cor, acção, movimento e muita adrenalina se misturam, e em que a personagem de Adam Sandler brinca com as palavras dizendo «estou muito gay» (gay=alegre). Mas a imagem dos gays passa para lá deste estereótipo, quando um dos bombeiros (o mais machão, com cara de mau) assume a sua homossexualidade. Apesar da gestualidade confusa quando se assume homossexual (parece que todos os gays têm de ter trejeitos de fêmea!), alguns mitos caem por terra com esta comédia, mostrando também como dois homens, qual deles o mais alheio à realidade da homossexualidade, assumem a defesa dos princípios da liberdade do ser humano, da liberdade de escolha, da liberdade de ser/estar na vida como se quiser (reparem como termina a festa e a manifestação anti-gay, ou o apoio incondicional da corporação de bombeiros aos dois homens que fingem o casamento). O discurso final da personagem de Dan Ackroyd, o chefe dos bombeiros, diz tudo: «sei que este casamento é uma fraude, embora com boas intenções, mas o que interessa se se é homossexual, heterossexual, transexual, etc.?».
O mundo é composto de gente diversa, essa é a grande mensagem. Também a menina discursa brilhantemente em Tribunal, oferecendo uma vasta gama de espécies animais que praticam a homossexualidade e dando esse aspecto como natural na vida do planeta (quando ela um dia estudar literatura e cultura gregas ainda ficará mais espantada!).
Muito boa a cena de «apanhar o sabonete» nos chuveiros comuns dos bombeiros, mostrando bem o receio estúpido de se ser «violado» por um amigo só porque é gay…
Por outro lado, a amizade dos dois homens sai incólume das diversas peripécias, os dois conseguem rir-se do próprio casamento encenado e fotografado por um chinês míope, cujo discurso base, em inglês achinesado é sempre o mesmo «o círculo representa a união dos opostos, por isso a aliança não é um quadrado, rectângulo, etc.». Serve para recordar a todos os que se casam… Brilhante a parte em que a testemunha principal é um sem-abrigo com um discurso desconectado do mundo real, que esfrangalha o bolo à procura de explosivos e sabe danças russas.
Gostei ainda da advogada, mulher bonita e inteligente, mas emocionalmente frustrada, que na sua ingenuidade abre o coração a uma amizade genuína com um dos elementos do casal encenado. Evidentemente que se apaixonam e ficam juntos, mas fica registada a confiança que uma mulher deposita num homem gay: desde despir-se à frente dele, a pedir-lhe que lhe apalpe as mamas («vê, são verdadeiras e ninguém acredita! Não é silicone, é real!») ou lhe ensine os preliminares do sexo.
Tudo acaba bem, num casamento homossexual que mistura tudo e todos numa alegria contagiante, sem cair no espalhafato. Um filme engraçado e com mensagens positivas.


2 Comments:

At 1:37 PM, Blogger paulo said...

Ainda bem que foste. É de mijar a rir com a história, porque não gosto do Sandler. Um filme muito positivo.

 
At 10:28 AM, Blogger fercris77 said...

A gozar mandam ali umas bocas ao preconceito dos «machões» contra os homossexuais!

Viva a liberdade!...

 

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