A educação Hoje em dia são poucos os pais rígidos, que tínhamos antigamente. Mais facilmente encontramos uns pais como os da Paris Hilton, pouco interessados em educar, no verdadeiro sentido da palavra, que são raros apenas porque têm rios de dinheiro, do que uns pais como os do tempo do Salazar, que não deixavam ninguém sair de casa, e queriam as filhas casadas com um «bom rapaz». Vê-se menos essa rigidez, apesar de os pais quererem ainda fazer dos filhos posses, quererem mandar neles e comandar as suas vidas. Somos a geração do «entalados»: licenciados sem emprego, mas com vida sexual, e sem autonomia nenhuma na vida. Somos uma geração triste. A geração da Heidi, da Abelha Maia cantada pela Ágata, da pastilha Gorila com açúcar que dava camisolas quando havia cromos repetidos. Essa geração transformou-se num bando de gente atrasada (eu queria mesmo era dizer uma asneira, mas não digo, por respeito aos leitores), que quer colo todos os dias, que não lhe apetece fazer o trabalho doméstico aos fins-de-semana para ir fazer o mestrado, mas que tem a regalia de comer e dormir em casa de graça. E já não falo de casos como o meu, que só tenho emprego quando o rei faz anos. Falo de muitos casos patéticos de pessoas que escolhem viver em casa, com os pais, sem chatices, enquanto a vida lhes passa ao lado. Para além do defeito geracional, dos defeitos de fabricação nesta geração e mesmo das dificuldades profissionais e sociais de integração na vida activa (o centro de emprego nem sabe o que fazer a tantos licenciados desempregados), os pais da geração de 70 são os que viveram o 25 de Abril ainda muito jovens. Ficaram sem pontos de apoio: incapazes de dar uma educação tão rígida quanto aquela que eles próprios tiveram, não sabiam mais como educar. Fizeram de nós hóspedes na casa deles ad aeternum, com gosto e satisfação, visto que a expectativa que sobre nós recaiu foi só a de sermos «doutores» e nada mais. Trabalhando ou não trabalhando, em casa está-se bem. Isso basta-nos. Sempre nos bastou. Fomos preguiçosos quanto bastasse ao ponto de passarmos a escrever o português com erros e sem vírgulas. Poucos de nós sabem sequer o que é «escrever». Somos também uma geração criativa, talvez porque, muito dados à depressão, tivemos de arranjar escapatórias. Somos a geração do «humor inteligente», deixando de lado a brejeirice e o teatro Revista, que não faz sentido nenhum nos dias que correm, visto que há a Contra-Informação no canal público. Como muitos valores se foram perdendo, e hoje em dia quem se safa é o mais esperto, ficámos também sem pontos de apoio concretos para educar os nossos filhos. Começámos, de há uns anos para cá, a achar que punir uma criança é uma desgraça, que vamos arder no Inferno por isso. Há mais de vinte anos a minha tia foi severamente admoestada num supermercado por dar uma palmada na mão à minha prima, que tinha derrubado qualquer coisa de uma prateleira, após avisos vários para não o fazer. Então como será agora? Alguém tem coragem de dar uma palmada a uma criança? Não me parece. Estou farta de ver crianças a fazerem birras do caixão à cova, de se esparramarem no chão aos gritos porque querem um chocolate e nem vejo onde estão os pais delas. Há uns anos atrás, aquilo durava cinco segundos. Aparecia o pai, levantava a criança, batia-lhe e acabava-se. Estava feito. Hoje em dia os pais entram demasiado em «negociações», e nem sempre as crianças entendem isso de negociar, não têm grande capacidade de abstracção. Depois vem aquela ideia de que, como pais, somos maus e incompetentes, que estamos a punir demasiadamente as crianças ditas «índigo», mais ligadas a um mundo espiritual e orientado para o futuro. Que raio de espiritualidade é essa, que as faz quererem tudo e mais alguma coisa? Orientamo-las mesmo é para a futilidade das marcas, das roupas, do ser mais fixe do que o colega. Eu não era uma miúda nada fixe, nada bem vestida, nada fútil, e estava-me perfeitamente a cagar para isso tudo. Não me parece que isso me tenha feito mal. A falta de tempo, de espaço, de lugar para as crianças é fulgurante, nos dias que correm. As nossas carreiras, se tivermos emprego, são totalmente incompatíveis por causa de horários terríveis, de colegas terríveis, da falta de dinheiro. As grávidas trabalham até ao último mês, até ao último dia antes do parto, e as crianças nascem nervosas por causa do consumo de carne vermelha em excesso. As crianças não fazem parte da nossa vida, não são verdadeiramente educadas, com valores como o trabalho, a honestidade, a solidariedade. Por isso ficam confusas, desaustinadas. Pensam que a regra é trapacear, ludibriar, ignorar o próximo. E ser rápido, para não perder oportunidades, não perder tempo. É duro, hoje em dia, tomar a opção de ser mãe ou de ser pai. Há um mínimo de condições que, se não temos, levam ao desespero. A facilidade na perda de um emprego, a dificuldade de sustento consequente, a dificuldade de educar, e os divórcios constantes. Tudo desanima. Ter filhos, que dantes era uma opção óbvia, tornou-se uma opção tortuosa. E educá-los de forma coerente ainda mais. Acho que hoje em dia preferimos ser só filhos e não arriscar muito para não sair borrada – de preferência queremos ser filhos sob alçada dos pais. Somos uma geração que corre poucos riscos. |
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